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terça-feira, 19 de abril de 2011
Niilismo parte 2
Para reduzir o homem a nada, e compreender que isso demonstra o niilismo existencial, temos de apreender o vazio objetivo da existência, sendo óbvio que, na condição de sujeitos, só podemos fazê-lo subjetivamente. O problema é que, no processo demonstrar que a existência é vazia, somos o próprio vazio que estamos tentando apontar — tentamos explicar que nós próprios não temos explicação, que vivemos dentro do universo que o niilismo destrói. Parece paradoxal, mas não é. Bastará que consigamos entender nós próprios como um fato, e o niilismo se tornará praticamente uma obviedade. Só então perceberemos que o niilismo não é, como a princípio pode parecer, uma postura extremada, envolvendo algum tipo de revolta, mas apenas uma visão honesta e sensata da realidade, uma visão tornada possível em grande parte devido às descobertas científicas modernas. Com algumas definições e explicações simples, podemos chegar a uma noção razoável da ótica apresentada pelo niilismo existencial. Como o argumento é um pouco longo, vamos por partes. Façamos algumas observações preliminares sobre por que o niilismo nos parece algo tão incômodo.
Muitos, por preconceito, têm medo do vazio da existência, mas esse medo, em si mesmo, é algo completamente sem sentido, pois equivale a temer aquilo que não existe; o vazio não é uma ameaça positiva. Senão, vejamos: Não existe vida em Vênus. Alguém se sente aterrorizado diante dessa afirmação? Dificilmente. Não existem bancos em Marte. Alguém empalidece diante disso? Também não. Suponhamos, entretanto, que durante todas as nossas vidas houvéssemos trabalhado arduamente, acreditando que todo o nosso esforço seria convertido em dinheiro num banco em Marte. Agora sim nós nos sentiríamos ameaçados pela afirmação de que nesse planeta não há, nunca houve banco algum, pois vivíamos em função disso, acreditávamos nesse suposto dinheiro marciano como aquilo que dava sentido às nossas vidas. Portanto, o que nos aterroriza não é o vazio da existência, ou o vazio de bancos interplanetários; o que nos enche de medo é a possibilidade de descobrir que estávamos completamente equivocados em nossas crenças a respeito da realidade. Seria esmagadora a consciência de havermos dado grande importância, de havermos dedicado nossas vidas inteiras a algo que simplesmente não existe. É por isso que estremecemos diante da afirmação de que a existência não tem sentido, embora essa afirmação seja tão segura quanto a de que não há dinheiro noutros planetas do sistema solar.
fonte: ateus.net
sábado, 9 de abril de 2011
Niilismo parte I
O niilismo pode ser definido como a implosão da subjetividade. Não se trata, entretanto, de algo difícil de ser definido, mas de ser apreendido. Por ser uma noção bastante ampla e abstrata, existe muita confusão em torno dela. Vejamos alguns dos principais motivos disso. Primeiro, o niilismo é vago em si mesmo, pois vem de nihil, que significa nada. A palavra niilismo, que poderia ser traduzida como nadismo, de imediato, não nos dá qualquer ideia do que se trata. Segundo, o niilismo não possui qualquer conteúdo positivo. Por se tratar de uma postura negativa, só conseguiremos entendê-la depois que tivermos consciência do que ela nega, e por isso a compreensão do niilismo envolve muitos outros conceitos; ele só se tornará visível depois que esboçarmos seu contexto. Por fim, o niilismo também não recebeu, historicamente, um emprego consistente, sendo que cada pensador ou movimento o interpretou de modo bastante particular, quase sempre com um pano de fundo ideológico, na tentativa míope de justificar um niilismo ativo e militante.
Em geral, vemos o niilismo associado a outras ideias, denotando seu vazio inerente. Por exemplo, niilismo político seria mais ou menos equivalente ao anarquismo, repudiando a crença de que este ou aquele sistema político nos conduziria ao progresso, o qual não passaria de um sonho mentiroso; o niilismo moral equivaleria à negação da existência de referenciais morais objetivos, ou seja, de valores bons ou maus em si mesmos; o niilismo epistemológico, à afirmação de que nada pode ser conhecido ou comunicado. Portanto, vemos que associar qualquer noção ao niilismo não é exatamente um elogio, mas algo como colocar ao seu lado uma placa dizendo: aqui não há nada, principalmente nada do que se acredita haver.
O niilismo, todavia, não é só um termo que justapomos a qualquer ideia que nos desagrade a fim de desmerecê-la. Seu poder de apontar o vazio das coisas não pode ser usado como uma arma, pois, quando se dispara o tiro de nada, automaticamente deixa de existir a arma, e a coisa toda vira um nonsense. O niilismo é um processo radical de crítica que não pode ser usado parcialmente. Não podemos, por exemplo, usar o niilismo moral para refutar valores específicos, com os quais não simpatizamos, imaginando que os nossos próprios valores sobreviveriam à crítica. Quando afirmamos que a moral não existe, isso implica que não existem quaisquer valores, sejam os nossos valores, sejam os de nossos oponentes. Com o niilismo moral, toda a moral é reduzida a nada, inclusive a nossa. A redução da moral a nada, como vemos, está respaldada não na gramática, mas na suposição de que a moral é vazia em si mesma, de que ela não tem fundamentos reais e objetivos. Não se trata de simpatizarmos ou não com a moral, mas da constatação segundo a qual ela é um sonho, uma fantasmagoria inventada por nós próprios, não sendo leis morais mais relevantes que leis de trânsito.
Nós, entretanto, nos ocuparemos principalmente do niilismo existencial, ou seja, a postura segundo a qual a existência, em si mesma, não tem qualquer fundamento, valor, sentido ou finalidade. Segundo o niilismo existencial, tudo o que existe carece de propósito, inclusive a vida. Todas as ações, todos os sentimentos, todos os fatos são vazios em si mesmos, desprovidos de qualquer significado. Nessa ótica, viver é algo tão sem sentido quanto morrer, e estamos aqui pelo mesmo motivo que as pedras: nenhum. Essa parece ser a categoria mais fundamental de niilismo, em relação à qual os demais tipos tomam o aspecto de casos particulares. Os niilismos moral e político, por exemplo, podem ser deduzidos do niilismo existencial — pois, se a própria existência não tem valor, isso implica que nada tem valor, inclusive valores morais, inclusive o progresso.
O único modo de compreender o niilismo existencial é através da reflexão. O vazio da existência nunca poderia ser demonstrado através da prática, ou apreendido por meio da experiência imediata. Se, por exemplo, reduzíssemos nosso planeta a nada com bomba nuclear, isso não demonstraria coisa alguma. A visão desse planeta despedaçado também não provaria nada. Tal postura destrutiva prática não faz o menor sentido, pois equivale a tentar refutar um livro queimando-o. O niilismo existencial se demonstra quando reduzimos o homem a nada, e para isso basta possuir algum talento intelectual aliado à honestidade, pois o esvaziamento da existência é a mera consequência de a entendermos. Não precisamos degolar a humanidade inteira para provar que a vida carece de sentido.
fonte:ateus. net
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